Dra. Helena Lanna comenta sobre a indisponibilidade do bem de família na jurisprudência do STJ

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A impenhorabilidade do bem de família e a jurisprudência do STJ

A Lei n.º 8.009/90, em seu artigo 1º, estabelece que “o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”. Considera-se como imóvel residencial, aquele utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente (artigo 5º, Lei 8009/90).

O objetivo da lei é resguardar a entidade familiar nas execuções ou cumprimento de sentenças, defendendo o ambiente em que vivem os seus membros e preservando o devedor do constrangimento de ficar desabrigado.

Após mais de 20 anos de vigência da lei, algumas questões tornaram-se controvertidas por não estarem expressamente previstas na lei (imóvel habitado por parente do proprietário ou por família de um membro só; penhorabilidade dos móveis que guarnecem a casa; utilizado como sede de pequena empresa familiar ou firma individual; etc.). Além disso, surgiram diversas interpretações às exceções à regra da impenhorabilidade elencadas taxativamente no artigo 3º da Lei.

Assim, o Superior Tribunal de Justiça vem pacificando o entendimento sobre essas questões, aplicando a lei com vistas aos fins sociais a que ela se destina. Nessa esteira, amplia a proteção legal às pequenas empresas familiares e às firmas individuais; resguarda os familiares do proprietário do imóvel mesmo que ele não resida no local; estende a garantia às famílias de um membro só; e considera impenhoráveis os equipamentos indispensáveis à normal sobrevivência da família (microondas, freezer, computador, impressora).

A Corte Superior sedimentou, também, entendimento sobre questão controvertida envolvendo imóvel dado em garantia de dívida assumida pelo casal que, nos termos do inciso V, do artigo 3º da lei, se inclui nas hipóteses de exceção à regra da impenhorabilidade: “execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar”.

O Superior Tribunal de Justiça, após amplo debate, pacificou o entendimento de que a dívida que legitima a exceção da lei é apenas a assumida em benefício da própria família, já que a instituição, nos termos da lei, não tem natureza econômica, mas social.

Nessa esteira, assentou que a “exceção do art. 3º, inciso V, da Lei nº 8.009/90, que permite a hipoteca, limita-se à hipótese de dívida constituída em favor da família, não se aplicando ao caso de fiança concedida em favor de terceiros” (STJ, 4ª T., REsp 268.690/SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, ac. 14.12.2000, RSTJ 150/395).

Em outros julgados, a Corte Superior decidiu ser impenhorável o bem dado em garantia de empréstimo contraído pela empresa, da qual é sócio o titular do bem onde reside sua família (STJ, REsp. 302281/RJ, 4ª T., Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 04/09/2001, in DJU 22/03/2004, p. 310; STJ, AgRg no REsp. 1026182/MT, 4ª T., Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 04/08/2009, in DJe 31/08/2009). Isto porque, a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, que, portanto, merecem a proteção legal (REsp 1022735/RS, 4ª T., Rel. Min. Fernando Gonçalves, ac. 15/12/2009, in DJe 18/02/2010) .

A Ministra Nancy Andrighi, ao julgar o Agravo de Instrumento n.º 1.067.040, asseverou que o instituto do bem de família existe para proteger a entidade familiar e não o direito de propriedade, razão pela qual a garantia não pode ser renunciada pelo dono do imóvel.

A questão, portanto, é de ordem pública e pode ser arguida a qualquer momento e por simples petição nos autos. Nesse sentido, diversos julgados do Superior Tribunal de Justiça:

“A impenhorabilidade do bem de família é matéria de ordem pública que não pode, nem mesmo, ser objeto de renúncia por parte do devedor executado, já que o interesse tutelado pelo ordenamento jurídico não é do devedor, mas da entidade familiar, que detém, com a Carta Política de 1988, estatura constitucional” (STJ, REsp. 1059805/RS, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, aac. 26/08/2008, in DJe. 02/10/2008).

“A impenhorabilidade do bem de família é questão de ordem pública e pode ser argüida até o fim da execução, mesmo sem o ajuizamento de embargos do devedor” (STJ, REsp 222823/SP, 3ª T., Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 06.12.2004).

Fonte: HTJ advogados

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